Em 25 de Maio de 2019 a (na época) recém fundada All Elite Wrestling realizava o seu primeiro evento: O pay-per-view Double or Nothing. Fruto do evento All In, organizado por Cody Rhodes e os Young Bucks no ano anterior, que havia sido o primeiro evento de luta livre nos EUA fora da WWE com mais de 10 mil ingressos vendidos desde a WCW em 1999. Em uma união de Rhodes e os Young Bucks com Kenny Omega e a bilionária familia Khan, principalmente na figura de Tony Khan nascia a AEW.
Exatos três anos depois do primeiro evento sob a bandeira da AEW, a empresa está as vésperas de realizar sua nova edição do Double or Nothing. Nesse meio tempo muita coisa aconteceu: Pandemia deixando arenas vazias, grandes nomes da WWE sem contrato, briga de ratings e até retorno de nomes que a gente imaginou não ver mais dentro de um ringue de luta livre. A empresa passou por altos e baixos durante esse processo, e vale a pena um olhar especial sobre eles.

Logicamente que não é possível englobar todos os acertos e erros de três anos de companhia em um único texto, mas vale a pena lembrar alguns pontos interessantes desses três anos de All Elite, a começar por seus acertos:
Marcação de posição dentro do pro-wrestling em pouco tempo
Em uma indústria tão monopolizada dentro dos EUA como a luta-livre, que possuía uma disparidade absoluta da WWE para com as rivais no país, o espaço alcançado pela AEW nesses três anos soam até surreais. Quando a WCW resolveu bater de frente com a WWF nos idos de 1995, ela trazia consigo uma bagagem de pelo menos 13 anos de existência entre Georgia Championship Wrestling, Jim Crockett Promotions e como própria WCW. A TNA, ultima grande “rival” da WWE dentro do mercado americano, que nasce em 2002 abastecida pelo excesso de talentos do fim da ECW e WCW, precisou de pelo menos 8 anos pra ter sua posição bem estabelecida dentro do mercado. Infelizmente quando as duas resolveram brigar diretamente com Vince McMahon nas noites de segunda feira assinaram suas sentenças de morte, algo que a AEW não fez (e eu espero de verdade que não faça).
Obviamente que a disparidade entre a WWE e a AEW na questão de reconhecimento de marca principalmente em um mercado global ainda é enorme, mas o posicionamento alcançado pela empresa já é muito relevante se comparado com as outras que estiveram na mesma situação nos últimos 20 anos.
As pessoas certas nos lugares certos
É bem comum que lutadores se juntem para fundar novas empresas, 90% delas se tornando indies (Como a Chikara de Mike Quackenbush e a CZW de John Zandig) e as que alcançavam maior proeminência depois de um tempo conseguiam parceria com grupos de mídia maiores (A própria TNA tinha como fundador Jeff Jarrett), mas no caso da AEW, a união entre Rhodes, Young Bucks e Kenny Omega com Tony Khan o filho do bilionário dono do Jacksonville Jaguars e Fullham, apaixonado por luta livre e com dinheiro para queimar num projeto arriscado dentro de um cenário de monopólio foi o encontro perfeito. Tony Khan tem seus defeitos (e nós vamos falar deles daqui a pouco) mas se não fosse por ele talvez a AEW não tivesse chegado ao seu primeiro ano de existência.
O dinheiro de Tony Khan como presidente da AEW foi peça chave para transformar o projeto em algo que passasse confiança para a Warner, por exemplo, que assinava um contrato televisivo com a empresa dez dias antes do primeiro show ir ao ar. Seria Tony Khan também o responsável por fazer a AEW superar uma pandemia de coronavirus que tirou o público, instrumento fundamental na construção de um evento de pro-wrestling. Vale lembrar que a própria WWE sofreu com a pandemia a ponto de declarar falência à XFL antes mesmo da final de seu primeiro campeonato de retorno.

O dinheiro de Tony Khan também seria responsável por trazer ao primeiro roster de uma empresa que não tinha feito nenhum show há 3 anos atrás uma mescla de grandes nomes do esporte junto de talentos promissores, fundamental para dar certo e o próximo ponto desse texto.
Os nomes conhecidos x os nomes da casa
Se a AEW tinha a vantagem de ter em seu quadro de vice-presidente quatro ótimos lutadores em Cody Rhodes, os Young Bucks e Kenny Omega, a chegada de ex-campeões da WWE como Chris Jericho e Jon Moxley já no seu show de estreia graças a capacidade financeira da empresa fez com que muitos olhos curiosos observassem os próximos passos da empresa. Junte isso a lutadores que já eram interessantes para o futuro do esporte como os Lucha Bros, Adam Page e MJF e você tem todo um cenário bastante promissor.
Aliás, essa mescla é, desde o começo, um dos principais acertos da empresa: Adam Page hoje é um dos grandes nomes do esporte, e já era muito bom naquilo que fazia no primeiro Double or Nothing, mas com certeza não era um favor de peso para fazer alguém assistir a uma luta ou não em 2019, e seu trabalho com Kenny Omega de lá pra cá foi fundamental nisso, e mesmo após a conquista de título, suas lutas com Bryan Danielson e Adam Cole foram degraus importantes para posicionar seu nome dentro da luta livre atual. O mesmo aconteceu com MJF e toda sua storyline com Chris Jericho e posteriormente com CM Punk, ou então o caso de Sammy Guevara e Cody Rhodes, e até o próprio Orange Cassidy com Jericho, a parceria entre Sting e Allin, a Blackpool Combat Club agora e por aí vai.
Quem acha que a AEW exagera com a quantidade de “debuts” de ex-lutadores da WWE parece não entender o que é colocar um programa novo na estrada: Muita dessa geração mais nova de talentos que pode se tornar um diferencial para o futuro estavam juntos em outros shows que simplesmente não ganhavam proeminência na mesma época em que a AEW era criada, como MJF, Lucha Bros e Swerve Strickland na MLW e Sammy Guevara, Scorpio Sky, Ricky Starks e até o próprio Cody Rhodes na NWA.
A escolha dos nomes conhecidos também foi perfeita: Promover lutas envolvendo Jon Moxley (Membro da Shield, um dos principais acontecimentos do esporte na década passada) Bryan Danielson (Que, vamos lembrar, foi o lutador que saiu com os dois títulos mundiais da WWE sobre os ombros em plena Wrestlemania 30, ganhando o principal destaque em um show que contou com o fim da streak de Undertaker), CM Punk (Que em 2011 e 2012 havia alcançado o mesmo patamar de Steve Austin e John Cena em capacidade de movimentação de público e naquele momento era o melhor do mundo, além de toda a aura por trás do lutador que estava longe dos ringues há 7 anos), Adam Cole (Que tinha seu nome como a referência de um dos melhores produtos de wrestling recente, como o NXT Black & Gold), entre outros ótimos talentos no ringue e que possuíam seu destaque pelo seu trabalho na WWE (O resto da Undisputed Era, PAC, Keith Lee, Miro, Matt Hardy, Tony Storm e por aí vai…) como forma de alcançar o interesse de um publico para uma empresa nova foi um ótimo acerto. Porém com tanto talento junto, a exposição dos primeiros dos erros que vamos explorar vem a tona.
A má administração no tempo de TV
A AEW claramente tenta mostrar pra nós que a maioria de seus lutadores são capazes de realizar excelentes lutas dentro do ringue. Todo Dynamite tem um clássico instantâneo e isso é algo realmente impressionante, uma vez que nós fomos induzidos pela WWE na ultima década que as lutas nos shows semanais não precisam ser tão importante e tão trabalhados assim, com lutas facilmente avaliáveis como “ok” ganhando destaque em meio a tantos comerciais. Porém ao mesmo tempo que a AEW se preocupa em fazer lutas memoráveis, parece esquecer muitas vezes o tempo que é gasto pra fazer uma luta assim, com lutas muito demoradas em momentos que o confronto dentro do ringue não precisa passar de, no máximo cinco minutos e que ainda seriam interessantes, já que a quantidade de talento anunciado faz com que os fãs queiram ver coisas mais interessantes dentro daquilo que foi anunciado para o evento.
Com lutas enormes dos seus grandes nomes em 3 horas de televisão, outros pontos de sua produção são podados, dois em destaque: Um deles são as promos. Muitas vezes nós temos dialogos nos vestiários muito parecidas uns com os outros, com conversas interrompidas pela metade (e isso sendo a única construção para uma luta acontecer) e dialogos muitas vezes sem nexo. Ter um motivo para ver as duas pessoas se enfrentando sendo construído semana após semana de forma que você queira ver o que os dois vão fazer na semana seguinte é o que mantém o interesse nos shows.
O outro ponto que vem sofrendo pela má administração do tempo de TV é a divisão feminina.
O pouco espaço para as mulheres nos shows semanais
O salto no destaque que as mulheres começaram a receber nos últimos 10 anos dentro da luta livre ocidental é impressionante, e tem sido uma das pautas mais importantes levantadas pelo publico da luta livre: O destaque igualitário para homens e mulheres dentro de um show de luta livre. Dentro da AEW, esse é um trabalho que também precisa ser desenvolvido: Segmentos completamente mal trabalhos, pouco tempo de tela em lutas curtíssimas e em pouca quantidade dentro dos programa que vão para televisão.
A AEW ainda deu sorte de ter uma injeção de talento inicial muito importante com a vinda das Joshis do Japão para os EUA em um momento de estabilidade da empresa, nomes como Riho e Hikaru Shida seguraram as pontas enquanto Britt Baker e Jade Cargill eram desenvolvidas para serem as faces da divisão feminina da empresa, além de ter em seu plantel enormes talentos víndos das indies, como Serena Deeb, Nyla Rose, Thunder Rosa, Kris Statlander, e bons nomes para o futuro, como Leyla Hirsch, a nossa Tay Conti, Anna Jay e Jamie Hayter. Em questão de talento a AEW tem uma força de trabalho muito interessante, mas sofre suas dificuldades na hora de cuidar disso.

Muitas dessas mulheres demonstram o seu ótimo trabalho dentro dos shows do AEW Dark e AEW Dark: Elevation, que garantem a ela bons tempos de ringue e números interessantes dentro do sistema de ranking por vitória-derrota da empresa. O problema é que para o grande publico a disseminação do conteúdo desses shows não tem, nem de perto, o alcance dos horários televisionados da empresa, já que a AEW mesmo pouco promove esse tipo de show, voltado para o Youtube da empresa. Elas estão lá mas não são vistas.
A delimitação de quatro pilares para a empresa
Quando a AEW resolve embarcar na ideia dos “Quatro Pilares da AEW”, citado por MJF em uma promo onde dizia que ele mesmo, Sammy Guevara, Darby Allin e Jungle Boy seriam os lutadores trabalhados pela AEW para se tornarem as estrelas do show, isso coloca uma imposição de que a empresa realmente precisa dar o destaque para os quatro, uma vez que a acusação de que a AEW só estava dando certo por causa dos “ex-WWE”, algo que a TNA fez 10 anos antes e que foi o motivo para a derrocada pra empresa (Quando AJ Styles e Samoa Joe perderiam espaço para lutadores como Kurt Angle, o que era aceitável, mas também nomes como Hulk Hogan, Jeff Hardy, Mr. Anderson, Rob Van Dam, entre outros…) e combatia isso colocando Sammy Guevara como TNT Champion e Jungle Boy como campeão de duplas por mais tempo que o necessário, assim como Britt Baker que também é considerada como um dos pilares e monopolizou a divisão feminina em torno do seu nome.
A influencia dos lutadores com poder dentro da empresa
Quando a gente reclama da má administração de tempo de televisão no show em um tópico anterior, um dos fatores que deve ser considerado tanto aqui quanto lá é sobre quem está consumindo o tempo de TV. Um dos lutadores que mais teve tempo de televisão nesses três anos de AEW com certeza foi Chris Jericho. Jericho por muito tempo foi o lutador favorito desse que vos escreve e ainda segue sendo um dos maiores gênios que já subiu dentro de um ringue, mas a presença dele em longos segmentos e storylines envolvendo stables desde que o AEW Dynamite foi concebido, em segmentos que muitas vezes são maiores que o necessário incomoda. O mesmo problema era atribuído à The Elite no ano passado, que também monopolizaram os títulos de duplas da empresa, com duplas como os Lucha Bros e FTR pedindo passagem muito tempo antes da época conquista no All Out 2021. Cody Rhodes enquanto lutador dentro da empresa também era outro que tomava longos tempos de televisão com suas storylines.

Com uma empresa que surgiu a partir da insatisfação de lutadores como o Cody Rhodes e os Young Bucks com as lideranças de suas antigas empresas e suas insistências em nomes repetidos tendo destaque sempre e atrapalhando a chegada de lutadores excelentes a posições de destaque, as mesmas práticas acontecendo dentro da AEW (mesmo com menor incidência) que resolve juntar muito talento em pouco espaço de tela acaba justificando muito das criticas aos novos lutadores que chegam para aparecer muito menos do que deveriam durante os Dynamites e os Rampages da vida.
Obviamente que nenhum dos pontos levantados aqui dão margem para uma “passagem de pano” nos problemas ou categorizam a AEW como ruim e ignoram seus pontos positivos. A AEW chega ao seu terceiro ano num patamar impressionante para o tamanho da empresa e tem todo potencial necessário para corrigir seus problemas.
Logicamente que em três anos muito mais coisa além das citadas aconteceram, e o texto já ficou enorme com os pontos já citados, portanto é compreensível que fatos que deveriam ser citados ficaram de fora. Logicamente também que os pontos levantados aqui estão sujeitos a discordâncias, e elas são necessárias. Não concordou com algo? Procura a nossa postagem na sua rede social favorita e vem conversar com a gente!
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